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A impossível aventura de Druk

  • Michel Schettert
  • 27 de jan. de 2023
  • 3 min de leitura

Atualizado: 17 de abr. de 2023

Filme narra uma experiência alcoólica irreproduzível na Amazônia





Thomas Vinterberg fez um filme que combina perfeitamente com o espírito da Escandinávia. Roda sua história em um dos países que mais bebem álcool no planeta. Afinal, faz muito frio na Dinamarca, a vida é rarefeita e resistir com humanidade não é nada fácil. Kierkegaard bem tenta ajudar. Os personagens são 4 homens, professores de uma escola cujos adolescentes bebem em média 50 cervejas por semana. Um deles está bem deprimido e já não vê alegria na vida disciplinada que a profissão acadêmica exige. Num jantar de aniversário, os 4 se reúnem e decidem iniciar um experimento, baseado numa teoria de um psiquiatra conterrâneo: o homem tem um déficit de 0,5% de álcool no sangue e deveria equilibrar este nível tomando uma taça de vinho por dia - assim melhora humor, autoestima e vida social. É claro que eles vão extrapolar limites, pois quase ninguém consegue segurar uma dose quando ela começa imediatamente a melhorar aspectos drásticos da sua vida. Pois eles aumentam a dosagem e vão fazendo relatórios sobre os efeitos, tudo num esquema de sociedade anônima, um clube de professores que bebem escondido. Os alunos passam a gostar mais das aulas e os sorrisos voltam a aparecer no dia-a-dia. Na medida em que a bebida aumenta, porém, a desgraça começa a aparecer, como já era esperado. Briga de família, desconfiança na escola, confusões no comércio etc. Bastante coisa ainda dá certo diante do que poderia acontecer de ruim. Neste ponto, o filme é bem romântico, apesar da dificuldade real em controlar o vício. A presença da razão é constante nas medições feitas com o bafômetro. Nota-se que na Dinamarca, embora a taxa de alcoolismo seja altíssima, o povo distingue muito bem o lugar do individual e do coletivo, do self e do outro. Em Copenhagen, especificamente, os problemas são complexos noutra ordem. Tudo funciona. Os espaços não se atravessam. A ética é presente nos laços sociais. A moral já não é um fardo. Há uma consciência adquirida, mesmo pagando um preço alto - autodegradação. Qualquer lugar tem disso, porém uma aventura igual a esta do filme jamais poderia dar certo na Amazônia. Aqui a entropia prevalece sobre qualquer tentativa de compreensão da realidade. É muito difícil manter alto o nível de percepção e controle sobre as diversas energias que se ativam depois que uma substância entorpecente começa a circular. Na Amazônia, as drogas (ilícitas ou não) são significativamente mais nocivas para as relações humanas porque espalham forças que se deslocam em fluxos invisíveis não mensuráveis. Quem veio ao Círio de Nazaré já pôde sentir esse espírito. A eficiência cósmica fala alto e quem explica isso, só os xapiris (ler Davi Kopenawa e ver Claudia Andujar). Quando e como acessar a potência transcendental é com eles. Mas voltando ao filme Druk - se passa na Dinamarca e cabe bem o alívio que uma birita dá no dia-a-dia. É uma outra frequência, onde o sol não bate perpendicularmente. A organização energética é outra. A fotografia do filme é muito bem conduzida, na mão, em boa parte do tempo. A câmera acompanha os movimentos dos personagens e os cortes estão em plena sintonia com os mesmos. O diretor emplacou a visão do ébrio na maneira de criar uma estética que relembra os filmes de Terence Malick com Emmanuel Lubezki, em Amor Pleno ou Árvore da Vida, usando jump cuts. A trilha sonora é outro destaque. Incorpora os sons na diegese com lindos momentos de cantos corais (um dos professores leciona música) e embalos rítmicos para os encontros beberrões. Druk foi o vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro em 2021. Assistam sem fantasias.

 
 
 

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